segunda-feira, 17 de abril de 2023

João Pessoa: o morto, o golpe de 1930 e o monumento em Porto União

Muitas vezes a gente lê o nome de uma praça ou de uma rua e fica se perguntando: "mas quem é esse sujeito?".  O cara que dá o nome à capital da Paraíba é o mesmo homenageado com um monumento aí pertinho do Clube Concórdia em Porto União.  Ele nunca esteve aqui e, certamente nem sabia da existência desse nosso vale do Iguaçu. No entanto, ganhou nome de praça, de avenida e até esse baita monumento no centro da cidade. Bora saber quem é esse sujeito!  

As eleições de 1930
Pelo esquema da política do café-com-leite que vigorou no final da República das Oligarquias (1894-1930), políticos de São Paulo (maior produtor de café) e Minas Gerais (maior produtor de leite) se revezavam na presidência da República.  

1930 era ano de eleições e o presidente que estava em fim de mandato, Washington Luís, paulista, deveria indicar o candidato que seria o novo presidente, e pelo combinado, teria de ser um mineiro. Só que Washington Luís indicou Julio Prestes, paulista. Mineiros ficaram indignados e como protesto, apoiaram o candidato da oposição, Getúlio Vargas, gaúcho que tinha como vice o paraibano João Pessoa. 

Julio Prestes venceu a eleição com 59,39 % dos votos e deveria assumir o cargo no final de 1930. Só que não assumiu! 

João Pessoa era advogado e político. Na época, ocupava o cargo de presidente de seu estado. Para enfrentar seus adversários, se utilizava de práticas não muito simpáticas como a que fez com o jornalista João Dantas. A mando de João Pessoa, policiais invadiram o escritório de Dantas e dali levaram cartas à época tidas como eróticas trocadas entre Dantas e a professora e poetisa Anaíde Beiriz. 

Tais cartas foram publicadas em jornais locais e trouxeram muitos danos à imagem dos envolvidos. 

No dia 26 de julho de 1930 João Dantas estava na cidade de Recife, Pernambuco. Neste dia também havia sido anunciada a visita à cidade do presidente da Paraíba, Sabendo que seu desafeto tomava café na Confeitaria A Glória, João Dantas pra lá se dirigiu, se aproximou de Pessoa e deu-lhe três tiros à queima roupa. 

O assassinato de João Pessoa  - que não tinha ligação alguma com a política nacional -  acabou sendo explorado pelo grupo de Getúlio Vargas, derrotado nas últimas eleições. Além das insinuações de que Washington Luis e Julio Prestes poderiam ter sido os mandantes do crime, ocorreu também grande exploração midiática do cerimonial fúnebre de João Pessoa. Seu corpo foi enviado ao Rio de Janeiro. No caminho a embarcação ia parando de porto em porto para "homenagens" e chamada à "revolução".  

Aproveitando-se da repercussão do crime, no Brasil todo foi se articulando um movimento golpista. Assim, em 24 de outubro de 1930, ministros militares depuseram Washington Luís que foi preso e depois exilado na Europa. Uma junta militar assumiu o poder que depois foi entregue ao gaúcho Getúlio Vargas. 

Esse golpe de Estado foi o início do processo chamado de Revolução de 1930. A partir daí, Getúlio ficou no poder até 1945. Ao mesmo tempo que trouxe mudanças positivas como os direitos trabalhistas, voto secreto, voto feminino e ensino primário público e obrigatório, Vargas foi também um governante demagogo e autoritário que cassou mandatos de políticos eleitos, censurou meios de comunicação e prendeu, torturou e matou opositores.   
 
João Pessoa mártir!
Após o assassinato de João Pessoa e o golpe de 1930, várias cidades colocaram o nome do morto em ruas e praças. Na Paraíba, a capital Cidade da Parahyba teve seu nome mudado para João Pessoa. 

Em Porto União e União da Vitória isso também aconteceu. Segundo Cleto da Silva, a Praça Moreira Garcez mudou para praça João Pessoa. Depois a avenida que vem do Bairro São Pedro até o Centro e que era antiga passagem de tropas teve também seu nome mudado. 

A prova de alinhamento de nossas cidades com a "Revolução de 1930" mais extravagante, no entanto foi o monumento ao "Precursor e martyr do novo Brasil" inaugurado em 5 de outubro de 1931 e reconstruído em 5 de outubro de 1971. De acordo com Lili Matzenbacher em seu livro Monumentos e marcos históricos de Porto União e União da Vitória, páginas 35 e 36:

O monumento é todo em cimento, sendo a alegoria de remate do mesmo material colorido, imitando bronze. O Anjo da Vitória possuía um metro e sessenta e cinco centímetros de altura e levava em uma das mãos uma coroa e, na outra, um facho de luz vermelha, símbolo da Revolução e servindo, também, como farol para as embarcações do rio Iguaçu. O capitel possui 90 centímetros de altura. A coluna, quatro metros de altura por sessenta centímetros de diâmetro na parte inferior. A base tinha 50 centímetros de altura; a escadaria 54 centímetros, o pedestal 2 metros e 80 centímetros. A altura total do monumento, que possui iluminação elétrica, é de 10 metros e 39 centímetros. (...).

Ao pé do Porto, ancoradouro movimentado por vapores e grandes lanchas, que faziam transporte de produtos para outros centros do Paraná, foi projetada uma praça, a que ocuparia todo o sítio de acesso à ancoragem. Consentiu a Municipalidade, que em seu lugar fosse edificada a sede do Clube Náutico. Ambas não foram concretizadas. Neste local foi edificado um monumento à memória no inesquecível candidato da "Aliança Liberal" à Vice-Presidência da República no quadriênio 1930/1934. 

Em 2016, com trabalho do artista plástico Roque Correia a prefeitura de Porto União fez a restauração do monumento, conforme as imagens no pé da página. 

Referências:
Monumentos e marcos históricos de Porto União e União da Vitória, de Lili Matzenbacher. 1ª edição. Porto União: Uniporto, 1985;

Apontamentos históricos de União da Vitória 1768-1933, de Cleto da Silva. Curitiba: Imprensa Oficial, 2006;

Morte de João Pessoa: 90 anos do crime que marcou a Paraíba e mudou a política no Brasil, de André Resende, disponível em https://g1.globo.com/pb/paraiba/noticia/2020/07/26/morte-de-joao-pessoa-90-anos-do-crime-que-marcou-a-paraiba-e-mudou-a-politica-no-brasil.ghtml acesso em 17/04/2023;

O monumento e o sorriso do professor, de Vitor Marcos Gregório. Disponível em http://www.jornalcaicara.com.br/colunas/o-monumento-e-o-sorriso-do-professor/ Acesso em 17/04/2023;

Propaganda eleições 1930 (Fonte: Blog do Enem)



Velório de João Pessoa (Fonte: G1 PB)



Inauguração do monumento em 1931. (Fonte: Rádio Colmeia) 



Monumento hoje (Fonte: Jornal Caiçara)


Monumento restaurado por Roque Correia. (Foto minha)

Monumento restaurado por Roque Correia. (Foto ruim mas é minha)


Monumento restaurado por Roque Correia. (Foto ruim mas é minha)


Foto minha

Plaqueta restaurada por Roque Correia. Foto minha